O Brasil enfrenta um desafio significativo em seu sistema tributário, que é percebido por muitos como desigual e favorável aos mais ricos. Um estudo aponta que a tributação no país privilegia os endinheirados, fazendo com que o Brasil funcione quase como um paraíso fiscal para essa camada da população. De acordo com Dão Real Pereira dos Santos, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, pessoas com alto poder econômico geralmente escapam de pagar impostos de forma mais eficaz do que a maior parte da população brasileira, que é composta por assalariados.
No dia 16 de outubro, a Receita Federal promoveu um debate em Brasília para discutir a proposta do governo que visa isentar totalmente os salários até R$ 5 mil e parcialmente os salários até R$ 7 mil, ao mesmo tempo em que pretende aumentar a tributação sobre os cidadãos mais ricos. Essa proposta, que está parada no Congresso há seis meses, é uma tentativa de cumprir uma das promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que busca fazer com que os mais ricos contribuam mais para o Imposto de Renda.
Robson Barreirinhas, secretário da Receita Federal, afirmou que esse projeto é um passo importante em direção à justiça tributária e pode ser visto como um “14º salário” para muitos trabalhadores. No entanto, a proposta enfrenta forte resistência do pequeno grupo dos mais ricos, que exerce grande influência dentro do Congresso. O deputado Mauro Benevides Filho, que faz parte da comissão responsável pela proposta, disse que a pressão desse grupo é uma das razões para o atraso na votação da medida. Além disso, há uma movimentação de certos setores, especialmente da extrema-direita, que busca aprovar uma anistia para aqueles que cometeram ações consideradas golpistas.
Barreirinhas também lembrou que algumas medidas já foram aprovadas pelo governo Lula, como a taxação sobre lucros de investimentos financeiros que estão no exterior e de fundos considerados paraísos fiscais dentro do Brasil. Essas taxas geraram cerca de R$ 20 bilhões em 2024, quantia que se deve repetir em 2025. Contrariando a expectativa de críticos, a implementação dessas tributações não provocou fuga de capitais, segundo o secretário.
Um estudo apresentado durante o seminário revelou que, em média, os milionários brasileiros pagam cerca de 20% de imposto, uma taxa muito inferior àquela paga por ricos nos Estados Unidos (36%), na Itália (37%) e na França (42%). Este cenário é explicado por algumas características do sistema tributário brasileiro: a regressividade, que onera mais os mais pobres devido à alta taxação sobre o consumo; a isenção do Imposto de Renda sobre lucros e dividendos, que beneficia em geral quem já está na classe alta; e a ampla concessão de benefícios fiscais a grandes empresas.
Esses fatores colaboram para manter a desigualdade no Brasil em um patamar elevado. Atualmente, 1% da população concentra 27% da renda nacional, enquanto nos Estados Unidos esse grupo detém 19%, na Holanda 14% e na França apenas 11%.
Dão dos Santos argumenta que a questão do sistema tributário no Brasil é mais política do que econômica. Ele destaca que a verdadeira mudança só acontecerá por meio de uma mobilização da opinião pública a favor de uma tributação mais equitativa. A Constituição de 1988 estabeleceu o Brasil como um Estado de bem-estar social, comprometendo-se a garantir direitos essenciais como saúde, educação e assistência. Existem preocupações sobre como o neoliberalismo, que começou a ganhar força nos anos 1980, interferiu nos objetivos originais da Constituição.
Desde então, houve mudanças significativas, como a redução drástica na alíquota máxima do Imposto de Renda, que caiu de 45% para 25% em 1989, e a eliminação da taxação sobre lucros e dividendos em 1995. Recentemente, uma proposta da deputada Julia Zanatta sugere a extinção do Imposto de Renda. A situação atual levanta questionamentos sobre a responsabilidade do Estado em proporcionar serviços e garantir direitos à sociedade.
