A dura trajetória das mulheres que buscam o aborto no Brasil

O Drama do Aborto Ilegal no Brasil
Sophia da Silva, uma mulher de 45 anos, enfrenta um dos momentos mais difíceis de sua vida: a gravidez resultante de um estupro. Mãe de duas filhas e viúva, ela revela em meio à angústia: “Eu queria me matar”. Essa frase, repetida ao longo de sua história, resume seu desespero ao descobrir que estava grávida após um ataque violento.
Tudo começou na Páscoa, há dois anos, quando Sophia foi até o supermercado sozinha. Seu marido havia falecido recentemente, e ela queria comprar ovos de chocolate para as filhas. No caminho, um homem a abordou, pediu informações e, em seguida, a estuprou. A dor e o trauma a levaram a um hospital, onde foi orientada a registrar a ocorrência. No entanto, ela hesitou, temendo represálias do agressor e desconfiança da polícia.
A legislação brasileira, que permite o aborto apenas em casos de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto, exige que a vítima apresente um boletim de ocorrência. Ao ser atendida por uma assistente social, Sophia foi informada de que não poderia interromper a gravidez sem esse registro, o que a fez sentir ainda mais impotente. “Como eu poderia amar essa criança?”, refletiu, mergulhada em uma sensação de sujeira e revolta.
Desesperada, Sophia procurou pílulas abortivas em sites da internet, mas, como não tinha dinheiro suficiente e temia sua eficácia, decidiu por conta própria ao adquirir substâncias no mercado ilegal, guardando-as no banheiro. Em sua mente, a ideia de que a morte do feto seria a única forma de escapar de sua situação a consumia. Em um momento de vulnerabilidade, ela já esboçava o que escreveria em um bilhete de suicídio: “Prefiro estar morta do que grávida”.
O destino virou quando uma colega de trabalho notou seu sofrimento e a apresentou a uma organização que oferece apoio a mulheres nessa situação. A fundadora do Projeto Vivas, advogada Rebeca Mendes, garantiu a Sophia acesso a uma clínica na Argentina, onde poderia interromper a gravidez legalmente, sem necessidade de boletim de ocorrência. Essa alternativa, embora salvadora, não a deixou totalmente aliviada. Sophia decidiu se desfazer das pílulas apenas após ter certeza do sucesso do procedimento.
Infelizmente, muitas mulheres enfrentam situações semelhantes sem a mesma rede de apoio. Pesquisas mostram que, no Brasil, aproximadamente uma mulher morre a cada cinco dias devido a complicações de abortos ilegais, que chegam a superar um milhão anualmente. O estigma em torno do tema gera um ciclo de silêncio e medo, dificultando o acesso a cuidados adequados e seguros.
Laura Valente, de 30 anos, viveu uma situação de desespero semelhante. Ao descobrir sua nova gravidez, ficou desesperada. Mãe de três crianças pequenas, ela buscava formas de evitar a cidade pequena e empobrecida que habitava e se sentia presa por não ter acesso a métodos contraceptivos em tempo hábil, devido à morosidade do sistema de saúde. A dificuldade de conseguir uma vasectomia para seu marido e a falta de opções seguras a levaram a pensar em abortos clandestinos.
Laura encontrou informações na internet sobre pílulas abortivas e também sobre fraudes relacionadas a esses produtos. A dor de ver uma prima morrer em uma tentativa abortiva a deixou cautelosa. Sua busca por ajuda a levou a uma organização que a orientou a viajar para a Argentina, onde o aborto é legal até a 14ª semana. Embora a viagem custasse um valor significativo, o Projeto Vivas cobriu os gastos.
Juliana Martins, de 32 anos, também passou por uma experiência traumática e perigosa. Ao descobrir que estava grávida, a pressão social e familiar a fez sentir que não poderia ter mais um filho. Em um momento de desespero, optou por um aborto ilegal e, ao buscar ajuda, enfrentou não apenas o desconforto do procedimento, mas também a brutalidade da abordagem policial. A detenção e o julgamento do seu caso destacaram a difícil realidade a que muitas mulheres são submetidas: enfrentar suas decisões em um ambiente hostil e criminalizador.
Ainda que o aborto continue sendo um tema polarizador no Brasil, é crucial destacar que muitas mulheres estão lutando por seus direitos e buscando alternativas seguras para o procedimento. Organizações como o Projeto Vivas estão desempenhando um papel vital, oferecendo auxílio e informações, enquanto o debate sobre a legalização e os direitos reprodutivos avança lentamente no país.
Em meio a essa luta, muitas vozes estão se unindo para reivindicar maior proteção aos direitos das mulheres, destacando que a decisão sobre a maternidade deve ser uma escolha pessoal, livre de julgamentos e perseguições.