Toxinas em ração de vacas alertam sobre segurança do leite
Sabe aquela sensação de alívio ao tomar um copo de leite gelado sem medo? Pois é, o leite produzido no Sudeste brasileiro está seguro para o consumo, mas tem um detalhe nos bastidores que chama a atenção de quem entende do assunto: as toxinas de fungos presentes nas rações das vacas.

Recentemente, pesquisadores de duas grandes faculdades brasileiras fizeram um levantamento inédito em cem fazendas do Sudeste e encontraram micotoxinas em todas as amostras de ração coletadas. Essas substâncias são produzidas por fungos e, embora o leite analisado não apresente risco para a saúde humana, existe um alerta sobre o impacto dessas toxinas na saúde dos animais e no bolso do produtor.
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Você já se perguntou o que realmente chega até o copo da sua família? O estudo, feito por especialistas da Esalq e da FZEA da USP, mostra que, mesmo com o leite “limpo” para nós, as vacas podem sofrer efeitos sérios quando comem rações contaminadas. As micotoxinas detectadas incluem nomes difíceis como fumonisinas, zearalenona, desoxinivalenol e aflatoxinas, todas produzidas por fungos que se aproveitam do armazenamento dos grãos, especialmente milho.
Para os consumidores, a boa notícia é clara: nenhuma das amostras de leite apresentou níveis acima do permitido por lei. Mas a conversa não termina aqui. “Nosso foco foi analisar se as toxinas presentes na alimentação das vacas passavam para o leite. Embora o leite esteja seguro, o problema está nos efeitos a longo prazo para o rebanho”, explica o professor Carlos Humberto Corassin, coordenador do estudo.
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Os pesquisadores analisaram tanto a ração quanto o leite produzido em propriedades de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, ajustando a coleta conforme a produção de leite de cada estado. Foram 75 produtores mineiros, 18 paulistas e três de cada um dos outros dois estados. Todos os produtores usavam sistemas produtivos diferentes, mas a contaminação era regra geral: 100% das rações tinham ao menos uma micotoxina e 86% tinham até quatro tipos ao mesmo tempo.
Entre as toxinas, as fumonisinas apareceram em todas as amostras de ração. E não foi só isso: zearalenona e desoxinivalenol marcaram presença em boa parte dos casos, além de pequenas incidências de aflatoxinas. Esses nomes podem parecer distantes da nossa rotina, mas, para os animais, podem significar problemas de saúde graves: desde queda na produção de leite até distúrbios hormonais, gastrointestinais e reprodutivos.
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Nos testes com leite, o cenário foi mais tranquilo. Substâncias como ocratoxinas e DOM-1 nem chegaram a aparecer. Mas algumas toxinas, como aflatoxina M1, estavam presentes em 14% das amostras, enquanto fumonisinas e zearalenonas apareceram em quase metade dos testes. O desoxinivalenol foi detectado em 42%. Mesmo assim, todos os índices ficaram dentro dos padrões de segurança alimentar definidos pela legislação.
O alerta dos pesquisadores vai para o efeito “invisível” no rebanho. As toxinas podem reduzir o apetite, causar diarreia, problemas de reprodução, lesões na pele e até dificultar a produção de leite. Isso impacta diretamente o bolso do produtor, que precisa monitorar de perto a alimentação dos animais e buscar formas de minimizar o risco, seja por análises frequentes das rações, seja pelo uso de aditivos antimicotoxinas eficazes.
“O perigo maior é a soma dos efeitos, já que a vaca pode estar exposta a várias toxinas ao mesmo tempo. Ainda não conhecemos totalmente as consequências disso para o animal”, alerta Corassin. Casos de intoxicação aguda podem causar distúrbios hormonais, problemas renais e queda de imunidade. Já a exposição crônica, ao longo dos meses, aumenta o risco de doenças mais graves, até câncer.
O estudo recomenda uma postura preventiva: monitoramento constante das rações e cuidados extras na escolha dos ingredientes, principalmente em períodos mais quentes e úmidos, que favorecem a proliferação de fungos. Para quem vive do leite, vale ficar de olho, já que mesmo sem causar risco para quem consome, as perdas para o produtor podem ser grandes.
Além dos cuidados na fazenda, a pesquisa sugere mais estudos sobre os efeitos combinados dessas toxinas. “Muitas vezes, a presença de várias micotoxinas na ração pode potencializar os danos, mesmo que cada uma, isoladamente, esteja abaixo dos limites seguros”, explica o pesquisador. O tema é especialmente relevante porque grande parte dos pequenos produtores brasileiros depende do milho e outros grãos armazenados, que são alvos fáceis dos fungos.
Os cientistas reforçam que a qualidade do leite brasileiro está garantida, mas a saúde do rebanho deve ser uma prioridade constante. Afinal, animal saudável produz melhor, gera menos custo e entrega um alimento ainda mais confiável para a mesa das famílias.
Por fim, fica a dica para o produtor: investir em análises regulares da ração e buscar orientação técnica pode evitar prejuízos silenciosos. Já para quem está do lado do consumidor, pode beber seu leite sem medo, sabendo que o produto segue os padrões de segurança, mas que é fundamental apoiar iniciativas que valorizem a saúde dos animais.
E você, já imaginava que o maior desafio para o leite pode estar na alimentação das vacas?
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